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CARTA ABERTA AO SENHOR PUTIN

Coimbra, 13 março 2022 Como se sente hoje o homem mais odiado pela humanidade? Acordou bem-disposto? Já marcou um x no calendário? Se fez bem as contas verificou que hoje é décimo oitavo dia!... Não está a correr como o planeado, pois não?... Já está ao corrente das últimas notícias da frente de guerra? Desculpe, eu queria dizer operação especial, mas sabe que nós por cá, nesta parte do mundo, chamamos de guerra ao que decorre na Ucrânia. Confesse lá que esperava que as coisas fossem mais fáceis? Duas semanas depois esperava dormir mais descansado, com aquela sensação do dever cumprido… A coisa resolver-se-ia em três ou quatro dias… Já lá vão dezoito! Sabe-se lá quantos mais…  Não encontra explicação para o que está a acontecer? Certamente que já pediu explicações aos seus generais… Eles possivelmente desculparam-se dizendo-lhe que a culpa é da NATO que fornece sofisticado armamento ao exército ucraniano... Sim, é verdade, mas o senhor também deveria saber que ninguém conhece melho...
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A CRIANÇA PELA MINHA MÃO

  A criança pela minha mão não sabe que um dia Irá sentir saudade dos seus brinquedos. Já se apercebeu Que está a crescer, mas sente-se confiante. Afinal Prometi-lhe de que sempre que tropeçar terá A minha mão para a ajudar a levantar. Julga Que não precisará de outras ferramentas… As lágrimas Não contidas, para tão pouca vontade de chorar, São apenas pormenores de uma vida que passa a correr. Com um sorriso nos lábios a minha criança sente-se apta Para os desafios que a vida lhe propõe.   E quando ela reparar que já não dispõe Dos brinquedos que hoje tem ao seu alcance? Quem lhe vai dizer que já não pode brincar? Quem A vai reprimir pelo cabelo cortado à boneca? Quem vai ler-lhe a história sem final?   Ela não vai conseguir Adormecer e eu ainda sou a única pessoa Que ela conhece que consegue mudar o que está escrito.   Porque ninguém diz às crianças a verdadeira Razão para não destruírem os seus brinquedos? Digam-lhes os p...

DIA INTERNACIONAL DA MULHER

  TRANSFIGURAÇÃO   Os melhores poemas sobre mulheres foram criados Por deuses à beira do abismo. Na ânsia de uma alma proibida, Estes poetas perderam a noção do seu corpo e na cadência Das horas desvividas não impuseram um limite à eternidade. Na origem, para os deuses perceberem que não podiam ir Mais longe, bastava fingirem-se de mortos e esperar Que nesse lugar-comum chamado de Olimpo, uma ténue Mão lhes trouxesse a auscultação da vida. Hoje, na interpretação Dos últimos sinais, quando ouvem a ordem para suspirar, Deixam de fingir a morte que deveras sentem.   No Olimpo, para se fazer justiça, quem está desatento Não entende cada gesto sagrado como uma carícia e prefere, Na urgência de dizer que não é feliz num corpo profanável, Dar um passo em frente e lançar-se à Terra. Está sempre Uma mulher atenta de braços abertos para quem escolhe Cair desamparado do céu. Os deuses entendem este gesto De salvação como um pronúncio do derradei...

BANQUETE

  Nos cem anos do Partido Comunista Português.   Como não tenho uma visão simples das coisas essenciais A minha descrença nasce do cooperativismo das aves migratórias. Não se precisaria de tanto céu azul para esta necessidade De rezar todos os dias para chover dia sim dia não. O vento que passa Despercebido pelos galos empoleirados nos celeiros não traz Boas-novas. Os necrófagos só se lamentam pelas leis do mercado Ditarem que de cada vez que o trabalho liberta um escavador Este sabe a que profundidade deixou de ser semente.   O teor das lágrimas mais cristalinas leva a que quem se recusa A parar de chorar possa temperar o coração oprimido com as utopias Prescritas para enganarem a fome dos homens exauridos. Para eu ser Mais científico teria de concordar que cada um dos tijolos Que constituem a grande pirâmide já foi uma criança no regaço De uma mãe com uma foice na mão. As linhas de produção só fabricam Poemas de liberdade quando na engr...

OS MEUS SENTIMENTOS

Quem me conhece mais profundamente sabe que se contenho as palavras ou é para não ser mal interpretado ou, porque tudo o que disser não irá corrigir a ordem natural das coisas. Nesta vida, em que o mal está feito, as palavras não se podem limitar a ser remendos. Nunca fui daqueles que corriam a pegar no telefone para “dar os sentimentos” ao dono da voz entaramelada que me atendesse do outro lado. Tenho grande dificuldade em dizer palavras difíceis. E “os meus sentimentos” são das palavras mais difíceis que me podem escutar. Quase tão difíceis como dizer a alguém, que não está preparado, que gosto dela. As minhas palavras podem fazer milagres no coração de alguém (decerto que já o fizeram!), podem levantar a cabeça a alguém que perdeu a esperança, podem até fazer voar alguém que ainda está na fase da instrução, mas não podem suavizar o vazio de uma morte. Nestes últimos dias, meses, tenho contrariado a minha indisponibilidade para com as palavras que me doem verter. Todos os dias alguém...
  A ESCOLA DA MINHA INFÂNCIA   Ao longo da vida passamos por muitas escolas. Mas nenhuma nos fornece mais ferramentas do que a primeira. Mas quando já possuímos as ferramentas primárias para podermos responder às perguntas do quotidiano, não nos damos por contentes e prosseguimos na busca desenfreada de conhecimento. Matriculamo-nos em cursos que apenas realçam a nossa ignorância e esquecemo-nos de resolver as coisas essenciais de que nos queixamos, como a falta de tempo e que para estabelecer um diálogo são precisos pelo menos dois interlocutores... A felicidade não vem com as perguntas que conseguimos satisfazer nos monólogos a que nos sujeitamos! Depois de conseguimos as respostas que perseguimos nasce sempre a necessidade de acrescentarmos novas perguntas. E, de compromisso em compromisso, não paramos para descansar de nós mesmos. Estamos todos fartos de nos aturarmos a nós próprios e pensamos que com novas respostas esgotamos a ambição por novas perguntas. Nada mais e...

AMÁLIA

No centenário marcado sobre o teu nascimento.   Minha amiga, estava à tua espera. Não te ouvi chegar, Mas também demorei muito tempo a dar pela tua ausência. Preciso de te pedir uma coisa… Ninguém me sabe dizer O que faço aqui sentado com as mãos enterradas nos bolsos… E de cabisbaixo ganha sentido persuadir as criaturas Subterrâneas a perguntarem se demoro muito A ir ter contigo ao reino onde cantas todas as noites.   Digo barbaridades, e são bastantes as contradições Para perceberem de onde venho. Quanto mais Para onde sigo descalço!… Inquietam-se com a minha fome Quando da última vez que comi não precisei de jogar À cabra-cega para perceber que não estava sozinho à mesa.   Preocupassem-se é com o silêncio! Já que o fado de cada um É saltar do berço para o caixão seria sensato terem-me Guardado as primeiras tábuas para esta urgência de naufragar. E se no fim eu preferir uma âncora? Isso é lá comigo! A minha capacidade para sofre...